A razão social das empresas: muito além de um nome bonito
Todo mundo trabalha por uma razão. Tem aqueles que são movidos pelo óbvio (e implacável) vencimento dos boletos. Tem os que se dedicam a ajudar os outros. Existem também aqueles com motivos estritamente pessoais, como dar orgulho para a família ou crescer como ser humano. E, claro, tem gente que nem curte muito essa história de trabalhar. As causas geralmente variam de acordo com a geração, o local de origem, a personalidade e as oportunidades de cada um. O que todos têm em comum é que, independentemente do porquê, o simples ato de exercer uma atividade impacta e gera consequências na vida das pessoas e de um lugar. E se você é um empreendedor ou representa uma empresa, bem… avance 10 casas no jogo e ainda ganhe um multiplicador de impacto.
As empresas com objetivo de lucro trabalham para fazer dinheiro, é claro, mas não apenas isso. Elas também têm um papel social a desempenhar, uma responsabilidade com a cidade, com os cidadãos, com o momento em que vivemos e com o futuro. Por isso, os empresários e executivos C-level que pretendem seguir jogando este jogo precisam assumir de uma vez por todas que as responsabilidades da sua empresa vão muito além do que acontece na sala de reunião.
Uma empresa, para resumir bem, é uma atividade econômica gerada por uma ou mais pessoas que se organizam para produzir alguma coisa utilizando insumos e ferramentas. A partir do momento em que nasce, a empresa ocupa um espaço real e mexe com a vida do lugar e das pessoas ao seu redor. Quando se estabelece a tal da razão social, esse novo ser vivo (sim, a empresa é viva) passa a existir no mundo e começa a influenciar o seu entorno.
Usando meu exemplo pessoal: já faz algum tempo que empreendo e, atualmente, sou sócia de uma empresa de educação corporativa e treinamento. Minha empresa emprega ao redor de 50 pessoas que, por sua vez, possuem famílias, sonhos e contas a pagar. Também servimos, através dos nossos softwares e soluções corporativas, aos interesses dos nossos clientes e dos clientes dos nossos clientes, gente que trabalha com computadores, geladeiras, chocolates, remédios, transporte e tantos outros produtos e serviços. Nosso trabalho ajuda essas pessoas a continuarem empregadas (e empregáveis), a crescerem na carreira, a seguirem ganhando seus salários, consumindo e fazendo a imensa máquina econômica dos países onde vivem continuar ativa. Da mesma forma, impactamos o trânsito da rua do Brooklin onde fica o nosso escritório, em São Paulo, e o lixo que produzimos certamente ocupa mais espaço e faz com o que o caminhão que passa às terças-feiras fique um pouco mais pesado e consuma mais combustível.
Por tudo isso, não dá para dizer que a minha empresa é responsável apenas por gerar lucro para os sócios, não é mesmo? Já faz tempo que começamos a falar sobre responsabilidade social corporativa, e evoluímos bastante neste assunto nos últimos anos. Hoje, é comum nos depararmos com relatórios anuais de sustentabilidade em que as companhias detalham seus compromissos, indicadores e desempenho neste assunto. Os newsletters e os eventos de negócios também estão inundados de conteúdo e de palestrantes especialistas no assunto (você certamente já foi convidado para pelo menos três este ano). Mas será que isso é suficiente para chamar a atenção do empreendedor e dos executivos para o papel das empresas na sociedade? Para a responsabilidade que elas assumem (assumem?) simplesmente por existirem neste mundo, nestes tempos, nesta sociedade?
Sejamos honestos: eu tenho dúvidas.
Talvez nem todos saibam, mas, no Brasil, essa função social está declarada na Constituição Federal de 1988, que atribui às empresas um caráter formador de cidadãos e a responsabilidade de propiciar o engrandecimento da sociedade de modo geral. Quer dizer: no nosso país, por lei, uma empresa com atividade econômica deve respeitar interesses internos (das pessoas que contribuem diretamente para o funcionamento da empresa) e externos (da comunidade em que ela atua), e só pode ser considerada legítima se gerar emprego, impactar no crescimento da comunidade e garantir uma existência digna às pessoas.
É sempre bom lembrar daquela frase que diz que “o certo é certo mesmo quando ninguém está fazendo”. O certo, neste caso, é que as empresas assumam a responsabilidade social pelas atividades que exercem e entendam que tudo o que elas fazem tem consequências: os produtos e serviços que escolhem lançar, as comunicações que realizam (ou não), a forma como tratam seus colaboradores, os critérios de escolha dos fornecedores e parceiros, a preocupação com o meio-ambiente (ou a falta dela), as prioridades que elegem e assim por diante.
Entretanto, caso os empresários e executivos C-Level ainda não tenham se convencido da necessidade de encarar esta responsabilidade com seriedade, eu deixo aqui alguns fatos e dados que provavelmente chamarão a sua atenção e poderão sensibilizá-los com relação ao papel que lhes cabe: Ser responsável vende mais — Em 2018, um estudo da Edelman mostrou que:
– Uma em cada duas pessoas costuma escolher ou trocar de marca em função da postura das empresas com relação a assuntos sociais;
– 67% dos consumidores já compraram um produto pela primeira vez motivados pela posição da empresa com relação a algum tema controverso;
– 65% não comprariam nunca de uma marca que preferisse não se manifestar e se calasse diante de assuntos relevantes.
Ser responsável ajuda a se destacar da concorrência e reter talentos.
O relatório Getting to Equal 2020, da Accenture, apontou que empresas com uma cultura corporativa voltada para a igualdade e a inclusão possuem uma forte vantagem competitiva de mercado e têm mais capacidade de atrair e reter talentos.
Ser responsável facilita a diversificar a carteira de produtos e serviços — Em 2021, numa pesquisa global sobre questões ambientais, sociais e de governança da McKinsey realizada com mais de 1.100 participantes em 90 países, mais de 90% dos entrevistados responderam que os temas relacionados com ESG estavam na ordem do dia de suas empresas sob um ponto de vista, veja só, de growth. Isso quer dizer que a preocupação com o tema está indo além da mera conformidade com os padrões da indústria ou dos requisitos regulatórios e alcançou um âmbito de negócio que visa a crescer através de novas oportunidades relacionadas aos pilares do ESG (“Environmental, Social, Governance”).
Ser responsável ajuda a conquistar e manter uma boa reputação — Segundo a consultoria espanhola Villafañe & Asociados, ter um propósito e uma estratégia corporativa voltados à sustentabilidade faz com que as empresas se adiantem às imposições regulatórias que surgem dia após dia, levando consumidores, funcionários e seus demais stakeholders a reconhecerem seu compromisso com relação a assuntos importantes para eles. O resultado dessa postura? Mais confiança por parte dos públicos e, consequentemente, melhor a reputação da companhia.
Ser responsável favorece a construção de relações comerciais. As chamadas “B Corps” (empresas que possuem certificação B, ou seja, um selo que avalia o impacto social e ambiental geral da companhia) formam parte de uma comunidade de líderes empresariais que realizam encontros presenciais frequentes para estreitar relações com clientes e fornecedores. Certamente, um ótimo exemplo de networking “do bem” para fortalecer vínculos comerciais.
Em definitivo, independentemente da natureza da sua empresa e do tipo de trabalho que ela realiza, é urgente lembrar que propósito e responsabilidade são muito mais que palavras bonitas para fazerem par com o quadro de “Visão, Missão e Valores” na parede da sua recepção. Hoje, saem na frente as empresas que já perceberam que se apropriar genuinamente do papel que lhes cabe na sociedade é simplesmente… necessário.
Por: Elaine Resende, sócia-diretora de Engajamento e Gestão do Grupo Take5. Executiva de Marketing e Comunicação com 20 anos de experiência no Brasil e no exterior. É graduada em Publicidade e Propaganda pela ECA-USP e mestre em Business Communications pela Universidad Complutense de Madrid. Empreendeu e trabalhou em empresas nacionais e multinacionais, agências de comunicação, startups e consultorias. Elaine é uma entusiasta da educação como meio para transformar as pessoas e o mundo.